Sentia falta de gente que nunca existiu. Eu andava pela rua, reconhecia rostos e desconhecia palavras. A distancia que separava minha mente da mente dos outros não foi suficiente para que eu parasse de fantasiar.
Talvez nunca pare.
Mas com ele era diferente. Quando o vi, pensei em desistir da humanidade. Minhas fantasias, a tanto tempo floridas e idealizadas, tornaram-se frias, ruins, quase insuportáveis. Tão ruins a ponto de não poder descrevê-las sem o uso de palavras baixas, das quais eu nunca ousei deixar escapar pela boca.
"Talvez o santo não bata" - especularam os que falavam por clichês. "Não, quando uma pessoa é muito parecida com a gente, a gente não gosta porque vê nossos defeitos nela! Verdade!" - uns usavam de certa psicologia para tentar explicar. Ninguém estava certo, ou eu não queria acreditar que as pessoas tivessem tanta facilidade para falar o que vai dentro do meu íntimo. "Invasão de privacidade!" - pensei alto. Era ódio, nervosismo daqueles de roer as unhas, vontade de olhar o tempo todo só para achar mais defeitos. Alguma coisa me prendia ao chão e eu olhava todo aquele emaranhado que tentava ser moda; cabelos atrapalhados, pulseira colorida, boné emprestado. Não gostava.
Quando ele abria a boca tinha vontade de sumir, pegar todos os papéis jogamos na mesa e, gentilmente, enfiá-los em sua goela; quando falava coisas inteligente, era arrogante; quando falava bobagens de me faze rir, era fútil; quando me beijou, era amor.